Isótopos estáveis e a busca por desaparecidos

Luiza Pecci Canisares

Engenheira Agrônoma pela ESALQ/USP e Mestranda em Ciências no Centro de Energia Nuclear da USP (CENA/USP).

Luiza Báo Sobreira

Cientista Social pela UnB e Mestranda em Antropologia Forense pela Universidade de Coimbra (Portugal).


Isótopos estáveis são variantes de um elemento químico que têm no núcleo atômico o mesmo número de prótons, mas diferente número de nêutrons e são estáveis (não emitem radiação). Esses isótopos podem ser utilizados como marcadores, sendo possível identificar os caminhos seguidos pelos elementos dentro de sistemas biogeoquímicos. Ou seja, o fracionamento isotópico, acaba por deixar marcas nos materiais (Costa, et. al, 2019), isto é, uma assinatura capaz de fornecer algumas informações interessantes sobre a origem das substâncias que pretendem ser investigadas.


Fonte: Revista Pesquisa Fapesp (nº 296).


O potencial de uso dos isótopos estáveis para o esclarecimento de casos práticos de perícia criminal tem sido demonstrado há mais de uma década. As pesquisas desenvolvidas e publicadas por investigadores do mundo todo e no Brasil (Shibuya et al 2006, Barbieri et al 2014, Muniz, 2017; Costa, et.al, 2019; Plens, et. al, 2020), vêm permitindo a utilização dessa metodologia, marcada pelo conhecimento do comportamento dos isótopos e suas assinaturas nos materiais (Costa, et.al, 2019). Mais recentemente, no Brasil, há uma crescente mobilização de grupos de pesquisa em torno da aplicação forense da ciência isotópica, como a fundação da RENIF – Rede Nacional de Isótopos Forenses – com o intuito de contribuir para a aplicação da metodologia isotópica na área forense.


Somando-se a isso, a Polícia Federal, por meio de sua Diretoria Técnico-Científica, está em fase de implementação do seu Programa Nacional de Isótopos Forenses. A iniciativa visa o desenvolvimento e aplicação de técnicas isotópicas em exames periciais de vestígios criminais nas mais diversas áreas da criminalística, tais como crimes ambientais, crimes contra a vida, análise de drogas ilícitas, falsificação de documentos, alimentos, medicamentos, mercadorias, obras de arte, dentre outras.


Diante de suas variadas aplicações, a ciência isotópica, junto às ciências forenses e, principalmente, à Antropologia Forense, também busca refinar critérios para identificação de indivíduos e ministrar informações que podem ser cruciais em uma investigação. A análise de isótopos estáveis, que envolve restos humanos, é particularmente interessante com corpos não identificados. Desse modo, o cruzamento de dados com listas de desaparecidos pode ser essencial, uma vez que os isótopos podem fornecer informações sobre o rastreamento geográfico e os movimentos migratórios do indivíduo, como indicar hábitos alimentares, a partir de tecidos humanos, como ossos, dentes, unhas e cabelos (Muniz, 2017). Além da vasta aplicação em investigações forenses, esse método pode ser utilizado para avaliar também diversos fatores sociais e ambientais importantes, como por exemplo, a relação dos hábitos alimentares da população de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).


Referências bibliográficas


Barbieri, Cristina Barazzetti, Jorge Eduardo Souza Sarkis, Luiz Antonio Martinelli, Isabella C.A.C. Bordon, Horst Mitteregger, and Marcos Antônio Hortellani. 2014. “Forensic Evaluation of Metals (Cr, Cu, Pb, Zn), Isotopes (Δ13C and Δ15N), and C:N Ratios in Freshwater Sediment.” Environmental Forensics 15 (2): 134–46. https://doi.org/10.1080/15275922.2014.890144.


Plens, Cláudia R.; Palhares, Carlos E.; Valenzuela, Luciano O. Isótopos aplicados à Antropologia Forense. Journal of Forensic Anthropology & Legal Medicine. Vol. 1, 2020.


Muniz, Taís Ribeiro. Análise de isótopos estáveis em tecidos humanos orgânicos e biominerais aplicada à antropologia forense. Trabalho de Conclusão de Curso. Orientação Profª Drª Cristina Valle Pinto-Coelho. Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2017.


Costa, Fábio José V.; Sena-Souza, João Paulo; Nardoto, Gabriela B. Determinação da origem geográfica de vestígios utilizando isótopos estáveis: base científica e potencial de uso no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Policiais. v. 10, n. 1. jan/jun 2019.


Shibuya EK, Sarkis JE, Negrini-Neto O, Martinelli LA. Carbon and nitrogen stable isotopes as indicative of geographical origin of marijuana samples seized in the city of São Paulo (Brazil). Forensic Sci Int. 2007 Mar 22;167(1):8-15. doi: 10.1016/j.forsciint.2006.06.002. Epub 2006 Jul 18. PMID: 16846711.

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