Meu pai tomou a terceira dose da vacina contra a COVID-19 nesta semana. Foi um dos primeiros do Brasil, com certeza, e talvez um dos primeiros do mundo.
Ele ficou um pouco triste e um pouco preocupado. Eu fiquei um pouco feliz e um pouco desconfiado. Não deveria ser assim.
Nos últimos dias pessoas aparentemente bem-intencionadas questionaram muito a aplicação da terceira dose com a Coronavac. A vacina da Pfizer foi sugerida como a mais adequada para o booster em populações idosas, nesse mar de informações e desinformações que vem sobre todos nós durante a pandemia. Não teve choro: 99% da população paulista que recebeu a terceira dose teve que se contentar com a Coronavac.
Foi certo, foi errado?

Só o tempo e os futuros dados reais esclarecerão isso. O a priori nunca foi tão temerário nessa época de provação e análises vagas por que passa a humanidade.
Essa referência que aqui expomos é muito importante agora que estamos construindo as Geociências Forenses no Brasil, a partir de base científica sólida internacional, casuística gigantesca nacional e pesquisadores que não podem ser nem afoitos, nem acomodados. De certa forma, isso é instigante, mas também muito arriscado.
Como a integração de esforços está unindo cientistas forenses, acadêmicos e policiais, profissionais e pesquisadores que buscam as certezas necessárias para o benefício da Justiça, ao mesmo tempo que os métodos científicos advindos das Geociências são adequados, adaptados e colocados à prova em cenas de crime, chegamos ao ponto de inflexão da Ciência robusta.
Erros, revisões, análises por pares, coerência lógica e interpretações sobre bases estatísticas de dados confiáveis serão frequentes e necessárias como nunca, em um campo do conhecimento que tem uma peculiaridade intrínseca: promove justiça ou injustiça. Não se pode voltar a locais de crime, não é possível reverter atitudes inconsequentes na persecução penal, não é possível isolar completamente os desvios de conduta quando trabalhamos próximos ao ambiente criminoso.
Esse é o pecado original das Geociências Forenses no Brasil. Nasce sobre a necessidade social urgente de se combater a criminalidade em todos seus sentidos, sem se deixar contaminar pelo estigma das pseudociências.
Como na situação introdutória duvidosa deste texto: é melhor trilhar caminhos desconhecidos ou seguir por caminhos mal orientados?
A construção do conhecimento sempre trará muitas implicações éticas e, infelizmente, quando travamos batalhas na seara forense, os erros muitas vezes não poderão ser corrigidos ou nem poderemos tentar de novo, na “mesa de projetos”. Essa consciência, quando tratarmos de solos, gemas, metais, meio ambiente ou ocultações, nunca será adquirida em salas de aula ou laboratórios, e sim em ambientes muito enviesados e por vezes com grandes interesses associados. Sejamos Cientistas!

Fábio Salvador
Geólogo, Doutor em Engenharia Mineral pela USP, Perito Criminal Federal e Ex-Diretor Técnico-Científico da Polícia Federal.